História do domingo: Então o mundo é nosso
Atualizado: 30 de set.
Amor vem ao amar
Como já dizia clarice lispector, "amar os outros é a única salvação individual que conheço: ninguém estará perdido se der amor e às vezes receber amor em troca."
Suíte Tóquio
Empregada conhece a intimidade das pessoas, suas calcinhas e cuecas do avesso, por isso sei que dizer eu te amo não é pra qualquer um. Tem homem que passa a vida sem dizer para o filho. Tem mulher que passa a vida sem dizer para o marido. E tem pessoas como a Neide que dizem pra todo mundo. Eu achei um absurdo quando nos conhecemos, uma coisa de sirigaita, dizer isso pra todo mundo. Até que eu comecei a reparar como a Neide era feliz, como o Lauro era feliz, e que talvez fossem felizes porque amavam mais, e talvez amassem mais porque falavam mais eu te amo. Como alguém me disse uma vez, a fome vem ao comer. Quem sabe o amor também venha ao amar.
O trecho é do livro “Suíte Tóquio”, da escritora paranaense Giovana Madalosso, um dos grandes novos nomes da literatura brasileira.
Antes de chegar nesta passagem, a personagem Maju diz que era como se o amor fosse uma coisa delicada demais, uma caixa de bombom com papel de seda que só algumas mãos podiam abrir.
Assim ela conta que nunca tinha falado eu te amo pra sua avó, mas sabe que sentiram um amor forte uma pela outra em seus 15 anos de convivência.
E aí, quando chegou o Lauro — dizendo eu te amo logo de cara —, Maju ficou sem saber o que fazer. Com um receio de dar a ele a frase que nunca tinha dito nem pra sua avó.
Mas será que o amor é mesmo um privilégio? Será que ele se gasta com o tempo e com a repetição? Será que o amor só acontece uma vez na vida? Será que é preciso dizer eu te amo pra amar?
Indo contra essa ideia, Antoine de Saint-Exupéry afirmava que o verdadeiro amor nunca se desgasta. Quanto mais se dá mais se tem.
Já Fabrício Carpinejar dizia que sempre antecipamos o “eu te amo”, depois só amamos por teimosia, para provar que era verdade.
E talvez seja por esse receio que a gente estranha quem demonstra amor com tanta facilidade. Que a gente julga pessoas como a Neide, que dizem eu te amo pra todo mundo.
Mas Fernando Pessoa lembra que o amor é dado de graça, é semeado no vento, na cachoeira, no eclipse. Ainda assim, há quem diga que é fácil dizer eu te amo, o difícil é amar de verdade.
Se expressando com as palavras ou usando as outras linguagens do amor, talvez o Lauro e a Neide realmente fossem mais felizes porque amavam mais. Se a fome vem ao comer, quem sabe o amor também venha ao amar.
Pra quem ainda está duvidando do poder do eu te amo, esse vídeo aqui pode inspirar. 🫀
Te amo não é bom dia?
ENQUETE DO THE STORIES
Você tem facilidade em falar "eu te amo"?
Refletindo sobre o #MomentoCult, sabemos que muita gente tem dificuldade em expressar seus sentimentos. Agora, queremos saber:
Você tem facilidade em falar "eu te amo"?
E na hora de responder?
Então o mundo é nosso
(Baseado em uma história real)
Em 2018, a “L” viu o “G” pela primeira vez, no campus da faculdade. Ele cursava física e estava sempre com um boné vermelho virado pra trás, rodeado de amigos.
Só foram se conhecer de verdade, porém, quando estavam na mesma turma de Cálculo III, e ela lembra que ele perguntou pra uma amiga como poderia conversar com ela.
“Diz pra ele que não gosto de caras insistentes” — a L não deu muita bola e respondeu algo assim.
Mas, aos poucos, eles foram conversando mais. O G contava pra ela sobre as viagens de moto que ele fazia, como gostava de acampar, observar o céu e conhecer lugares diferentes.
Com uma amizade tímida surgindo, combinaram de se encontrar em uma festa da faculdade, mas uma vitória do Cruzeiro e um joelho fraturado separaram o caminho dos dois.
Desde então, muita coisa aconteceu e eles acabaram perdendo contato. Até que, em 2023, ele mandou uma mensagem pra ela no Instagram.
Cinco anos depois, parecia que as coisas finalmente tinham se encaixado. Agora ia dar certo.
O primeiro encontro — ou reencontro — aconteceu em um barzinho, e foi aí que eles descobriram que eram muito mais parecidos do que a L imaginava.
Ela lembra dele falando com muito amor sobre a família, física quântica e filosofia. O lugar estava quase fechando, mas nenhum dos dois queria ir embora.
Eles se beijaram na chuva, antes de entrar no carro. Riram de quanto estavam envolvidos, e ela disse: o mundo é dos emocionados. Ele respondeu: então o mundo é nosso!
Nessa madrugada, a L chegou em casa e mandou uma mensagem pra sua melhor amiga: acho que encontrei o meu marido.
No final de semana seguinte, o G buscou a L para conhecer a sua família. Era apenas o segundo encontro, mas ela nem ficou nervosa. Parecia certo.
Ela fica espantada ao lembrar como o final de semana foi bom e como já sentia que fazia parte. Ele sentia isso também. Disse pra ela. Mas acontece que 75 km os separavam um do outro.
A L estava indecisa sobre algumas coisas e, às vezes, deixava o orgulho falar mais alto. As rotinas de trabalho também dificultavam a comunicação, e eles passaram um tempo sem conversar.
Ainda assim, ela lembrava dele todos os dias. Ele continuava no seu pensamento. Aliás, ainda continua.
Dizem que o amor, pra crescer, precisa ser alimentado. Mas o dela estava lá, guardadinho do jeito que ele deixou.
Alguns meses depois, a L resolveu chamar o G para o seu aniversário. E ele foi. Conheceu seus amigos e sua família.
Depois disso, eles passaram a conversar sobre os lugares que queriam conhecer. Entre planos de curto e médio prazo, decidiram que fariam um mochilão pela América do Sul em 2025.
Em um dia de março, a L convidou o G para passar o final de semana com ela, em uma confraternização de família.
Eles passaram o sábado em Ouro Preto, uma cidade histórica de Minas Gerais, conhecendo museus e cachoeiras.
Viveram dias recheados de muita comida boa, vinhos baratos, piadas ruins e risadas. Acamparam na varanda de casa e conversaram honestamente. Ela abriu o seu coração, e ele o dele.
Reconheceram seus erros, e o G fez um compromisso com a L: a gente vai fazer diferente dessa vez.
Se despediram no domingo, com planos de se encontrar em Capitólio no mês seguinte. Mal sabia ela que aquela seria a última vez que o veria.
O G se foi pra sempre, em um acidente. Quando estava quase chegando em casa. Exatamente 1 ano depois do reencontro dos dois.
O mundo da L caiu. Muitos “e se” apareceram na sua cabeça. Como a vida é injusta. Ela não queria outra pessoa. Tinha que ser ele. Como assim ninguém vai responder sua mensagem de “chegou bem?”.
Ela segue arrasada por essa partida precoce, mas agora sente uma vontade enorme de viver e realizar tudo aquilo que eles sonharam.
G, você ensinou pra L o que é liberdade, amor à família e alegria nas coisas mais simples da vida. Mostrou que temos que lutar pelos nossos sonhos, porque nunca sabemos o dia de amanhã.
Ter sido a última pessoa que o viu, dá pra L ainda mais força de honrar essa história. Ele tinha razão quando disse que o mundo era deles. E ela vai fazer questão de conhecê-lo pelos dois.
A L diz que não sente nenhum arrependimento. Viveu intensamente todos os minutos com ele — que era a pessoa mais fácil de amar que ela já conheceu.
Ela deseja que essa história possa inspirar outras histórias de amor. Que quem está lendo substitua o medo de se relacionar pela coragem de dizer eu te amo. Que troque o orgulho pela vontade de fazer acontecer.
Que sinta que qualquer dúvida pode ser esclarecida em vida, porque a morte só nos traz a certeza do que nunca poderá ser. No final do dia, amar demais nunca vai ser motivo de arrependimento.
Reprodução
Texto e Imagens: The Stories
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