História do domingo: Nosso amor é nosso
- reginaldorodrigues3
- 6 de abr.
- 4 min de leitura
Medo bobo
Pra quem está com medo de se arriscar no amor, a edição de hoje é um empurrão pra dar coragem.
Tempo de Amor


"Tempo de Amor” é uma canção da parceria entre Baden Powell e Vinicius de Moraes, lançada no álbum Os Afro-Sambas de 1966.
• Sua letra apresenta uma reflexão profunda sobre a dualidade entre paz e amor, trazendo uma visão melancólica sobre as relações humanas.
Ela diz que bem melhor seria poder viver em paz, sem ter que sofrer, sem ter que chorar, desenhando um desejo impossível de um viver sereno, em que não há lágrimas, nem dores, nem entregas que despedaçam.
Pra Vinicius de Moraes, paz não significa felicidade, mas sim uma espécie de conformismo ou ausência de emoções intensas, como de alguém que fecha o coração após uma decepção amorosa.
A dor prova que estamos vivos, que algo dentro de nós pulsa e se importa. Amar, mesmo que traga feridas, significa que tivemos uma vivência real, que fomos parte de algo maior que nós mesmos.
Como já dizia Martha Medeiros, “morre lentamente quem evita uma paixão, quem prefere o preto no branco e os pontos sobre os ‘is’ em detrimento de um redemoinho de emoções, justamente as que resgatam o brilho dos olhos, os sorrisos dos bocejos, os corações aos tropeços e os sentimentos.
A paz que não conhece o amor é apenas silêncio, uma ausência vazia onde o coração não pulsa.
• O mundo, enganador e cínico, trocou amor por conformismo, vestiu a paz como um escudo contra a dor, sem perceber que, sem paixão, a vida se desfaz em um nada. É tudo vazio.
Mas como lembra Vinicius de Moraes, “não existe coisa mais triste que ter paz, e se arrepender, e se conformar, e se proteger de um amor a mais.” Se o amor morreu, então que esse mundo não seja meu.
Nosso amor é nosso
(Baseado em uma história real)

Luciana nunca pensou que contaria a sua história de amor. Na verdade, nem sabe se dá pra chamar isso de história de amor, mas estava sentada em frente ao computador e sentiu vontade de escrever.
Por algum motivo desconhecido, hoje, ela acordou nostálgica. Talvez, seja a TPM, a lua nova em câncer ou a música Sozinho, do Caetano Veloso, que acabou de tocar no aleatório do Spotify.
• De qualquer forma, ela acordou pensando no Henrique. Já tomou café da manhã, deu comida pro cachorro e saiu pra correr, mas continua pensando nele.
Começando do começo, os dois se conheceram na infância — engraçado que a Luciana nem se lembra de como era a vida antes dele. Aliás, será que existiu vida antes dele?
Henrique morava na rua atrás da sua, e eles meio que cresceram juntos. Cidade pequena é assim, todo mundo conhece todo mundo.
Brincavam de esconde-esconde e queimada, e ele sempre ia na sua casa comer bolo de cenoura. Aparecia lá pra almoçar também, e chamava seus pais de “tio” e “tia”.
Quando entraram na adolescência, passaram a frequentar escolas diferentes. O pai do Henrique abandonou a sua mãe, que era enfermeira, e não conseguia pagar a mensalidade sozinha.
• Ainda assim, eles continuavam se encontrando depois da aula. Não brincavam mais, mas conversavam sobre tudo.
Eram melhores amigos. Nunca usaram essa nomenclatura, mas trocavam segredos, iam ao cinema e se conheciam melhor do que ninguém. Sabe quando duas pessoas se comunicam pelo olhar?
A amizade foi crescendo, e “alguma coisa” a mais também. Henrique foi o primeiro tudo da Luciana. Primeiro amigo. Primeiro beijo. Primeiro sexo. Primeiro namorado. Primeiro começo. Primeiro fim.
Durante a adolescência, terminaram e voltaram incontáveis vezes. Eram muito diferentes e brigavam muito, mas não conseguiam ficar longe um do outro. O término mais longo durou só um mês.
• Até que, chegou a hora de ir pra faculdade. Luciana queria fazer medicina, e passou no vestibular pra federal da cidade vizinha.
Henrique não fez a prova. Dizia que queria ser engenheiro, mas precisava juntar umas economias antes. Conseguiu um emprego e adiou seu sonho pro ano seguinte.
A faculdade da Luciana ficava em uma cidade bem perto, 3h de distância. Organizando direitinho, eles conseguiriam se encontrar todos os finais de semana. Resolveram tentar.
Nesse meio tempo, a vida do Henrique não mudou muito. Mesma cidade, mesmos programas, mesmos problemas e mesmas distrações.
Já pra Luciana, mudou tudo. Conheceu pessoas novas, fez novas amizades, passou a morar sozinha. Cada dia, aprendia uma coisa diferente. Era aula de anatomia, bioquímica e fisiologia.
• No começo, eles se ligavam todos os dias. Sentiam aquela saudade de doer o peito, e viviam os encontros e despedidas com muita paixão.
Com o tempo, essa conexão foi ficando mais fraca. Henrique não se identificava com os amigos da Luciana. Luciana não tinha muito interesse nas fofocas da sua antiga cidade.
Ela até poderia dizer que foi a distância física que desgastou o relacionamento dos dois, mas estaria mentindo. No fundo, ela sabe que foi a diferença social que causou esse abismo.
Em um final de semana qualquer, Henrique disse que queria conversar. Foi até o apartamento da Luciana, falou que a amava muito, mas sabia que aquilo não daria certo. Sussurrou que era melhor terminar.
Ela sabia das dificuldades dos dois, mas não esperava que ele desistiria tão fácil. Em sua cabeça imatura e egoísta, ela lembra que só sentiu raiva.
• Bateu a porta na cara do Henrique, e pediu pra ele nunca mais ir atrás dela. Gritou que nunca o tinha amado de verdade.
Ela não lembra muito bem do que aconteceu nas semanas seguintes. Parece que sua memória apagou todas as lembranças que sucederam essa conversa… Até chegar aquele 13 de maio.
Já fazia 6 meses que ela não tinha notícias do Henrique. Era um domingo como outro qualquer, até que ela recebeu uma ligação da sua mãe às 7h34: “foi acidente de carro. Ele não resistiu.”
Isso aconteceu há mais de 13 anos, mas Luciana nunca esqueceu. Ela seguiu sua vida, se formou, teve outros relacionamentos. Há dois anos, até juntou escovas de dente.
• Ela estaria mentindo se dissesse que se lembrasse do Henrique todos os dias, mas sempre que lembra é com muito arrependimento.
Arrependimento por não ter se despedido como deveria. Arrependimento por não ter falado “eu te amo” quando ainda o amava. Arrependimento por não ter vivido esse amor até a última gota.
Texto e imagens: The stories/Reprodução
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